7 Estereótipos Femininos que Hollywood Precisa Parar de Usar (Parte 2)

Eu já disse pra parar.

estereótipo

Há um tempo, escrevi a primeira parte deste texto de forma bem informal e sem grandes expectativas. Mal sabia eu, no entanto, que poucas horas depois eu veria meu site quebrar pela primeiríssima vez com a enxurrada de visitas que a postagem provocou.

estereótipoEu não tava preparada.

 

Foi nessa ocasião que eu percebi que não estava sozinha na minha indignação com a representação rasa, repetitiva e cansativa de mulheres no cinema – e que quanto mais discutíssemos isso juntas, melhor. Da discussão vieram muitas outras questões (e muitos outros textos), culminando, inevitavelmente, nesta segunda parte que vos apresento agora, com mais sete estereótipos femininos que Hollywood precisa parar de usar.

Agora, antes de mais nada, é preciso contextualizar e entender que a má representação de mulheres na frente das câmeras têm alguma relação com a sua patente ausência por trás das câmeras. Embora homens e mulheres estejam igualmente representados nas principais escolas de cinema dos EUA, ainda assim elas são ignoradas pelos grandes estúdios. Mesmo cineastas premiadas raramente são convidadas a dirigir filmes dos Big Six (os seis maiores estúdios de Hollywood). Em 2014, por exemplo, apenas 11 dos 100 filmes de maior bilheteria foram escritos por mulheres, e apenas 19 deles tiveram mulheres como produtoras. De 375 filmes feitos pelos Big Six entre 2010 e 2014, apenas 13 foram dirigidos por mulheres.

Dessa discrepância por trás das câmeras surgem inúmeras outras discrepâncias na representação de homens e mulheres nas telas do cinema. Dos 500 maiores filmes entre 2007 e 2012, somente 30,8% dos papéis com fala eram mulheres. Dos 100 maiores filmes de 2014, apenas 21% tiveram mulheres como protagonistas. E claro, além de serem poucas, muitas dessas personagens representam estereótipos e ideais machistas tão naturalizados que muitas vezes nem reparamos o quão absurdos eles são.

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Pois reparemos então. Afinal, o poder que a mídia tem de afetar a desigualdade de gênero no mundo é algo que a própria ONU já reconheceu e discutiu vezes sem conta. De acordo com Nanette Braun, da ONU Mulheres: “A mídia cria uma visão de mundo que se entranha profundamente na percepção das pessoas de como as coisas são. A maneira como as mulheres são retratadas perpetua atitudes discriminatórias e sexistas e a noção de que meninas e mulheres ‘não contam’”.

Sem mais delongas, portanto, confira abaixo mais sete estereótipos que contribuem para fortalecer essas noções e já deveriam ter sido aposentados há muito tempo. Estereótipos como…

A Mulher que Usa sua Sexualidade como Arma

Exemplos: 007 (franquia), Segundas Intenções, Uma Cilada para Roger Rabbit, Game of Thrones (série, não livros)

Dona de um corpo escultural e de uma confiança inabalável, A Mulher que Usa sua Sexualidade como Arma é uma das personagens mais temidas em filmes de suspense e ação. Por quê? Oras, porque ela não precisa de nada além do seu próprio corpo para conseguir o que quer.

Mantenha seus amigos perto, e seus inimigos mais perto ainda. – se é que você me entende.

 

A verdade é que os homens de Hollywood tem tanto medo de uma mulher com autonomia sexual, que esse é o estereótipo número um escolhido por eles quando querem retratar uma mulher poderosa, manipuladora ou temível. Afinal, de que outra forma uma mulher poderia conseguir o que quer, não é mesmo?

Atualmente, a série Game of Thrones usa esse estereótipo a torto e a direito – e sem respaldo nenhum dos livros em que é baseada, diga-se de passagem. Até a Sansa e a Margaery, duas personagens completamente não-sexualizadas nos livros, acabam utilizando esse recurso na série.

A Esposa Chata e Estraga-Prazeres

Exemplos: Escola do Rock, Ligeiramente Grávidos, Se Beber Não Case, Breaking Bad

A Esposa Chata e Estraga-Prazeres está sempre enchendo o saco, falando e falando na orelha do marido sobre como ele é irresponsável e imaturo, e nunca está lá pra ela, e só quer que ele cresça e pare de sair com aqueles amigos imbecis que estão sempre com cheiro de maconha, e se ele podia, por favor, parar de largar a toalha molhada em cima da cama. Em suma, ela está lá para atrapalhar a diversão do protagonista e nos lembrar que esposas são um saco, cara!

O interessante é que por mais sensato e razoável que sejam os pedidos e importunações da esposa, ela é sempre representada como uma chata de galocha irritante que exige demais do pobre marido que só quer se divertir, relaxar, ou cozinhar metanfetamina. Sim, estou falando de Breaking Bad, que teve na Skyler uma Esposa Chata tão odiada pelos fãs que a atriz que a interpretou chegou a temer por sua vida. Conte com Hollywood para conseguir fazer com que uma esposa preocupada com as atividades do marido traficante seja mais odiada como vilã do que ele.


Dá licença.

 

(Ver também Pais Trapalhões e o Problema do Falso Feminismo)

A Mulher que Vira Troféu do Herói no Final

Exemplos: Karate Kid, Shrek, Superbad, Filmes do Adam Sandler, Homem-Aranha, Homem de Ferro, Transformers

O estereótipo da Mulher-Troféu é um dos mais antigos e funciona de acordo com a premissa de que o herói sempre ganha a mocinha no final. Sim, pode ser que ela relute e tenha suas dúvidas antes de se entregar ao herói, mas todos nós sabemos que ela vai ceder no final.

O estereótipo em si tem sua origem na fábula milenar da donzela em apuros, com a diferença que agora não só a mocinha não precisa mais ser, necessariamente, uma donzela em apuros…

…como o herói também não precisa mais ser digno da mocinha. Na fábula moderna, até o mais babaca dos protagonistas (estou falando com você, Adam Sandler) pode acabar com a moça dos sonhos no final do filme – alimentando a ideia da mulher como um prêmio do homem por direito no imaginário de milhares de cretinos mundo afora.

(Ver também Mulher-Troféu: A Mulher como Recompensa do Herói na Cultura Pop e Beleza Interior? A Misteriosa Síndrome dos Caras “Feios” com Minas Gatas na Cultura Pop)

A Mulher Morta/Sequestrada/Desaparecida que Motiva o Protagonista Homem

Exemplos: Busca Implacável (1 e 2), Coração Valente, Ilha do Medo, O Fugitivo, Gladiador, Star Wars – Ataque dos Clones

Um dos truques mais usados pelos cineastas para colocar uma personagem feminina importante em um filme sem de fato colocar mulher nenhuma no filme é o estereótipo da Mulher Morta/Sequestrada/Desaparecida que motiva a história do protagonista homem. Pode ser que ela seja uma filha raptada, ou mesmo uma amada esquartejada por um serial killer do passado. Não importa. O que importa é que ela não está lá, e a sua ausência é o motivo de o protagonista fazer seja lá o que for que ele faz no filme.

estereótipoInclusive desenvolver fúria assassina.

 

Além da problemática óbvia da ausência da personagem em si, o fato de ela servir inteiramente como um acessório para a construção do protagonista homem eleva a cretinice desse estereótipo a níveis ainda mais altos. 

(Esse tipo de personagem é tão comum que tem até nome: Mulher na Geladeira. Leia mais sobre ela no texto de Tita Antunes, em Mulheres na Geladeira – e por que insistem em nos colocar lá).

A Mocinha que Ensina o Herói a Viver a Vida Intensamente

Exemplos: Elizabethtown, Quase Famosos, Garden State – Hora de Voltar, Doce Novembro, Scott Pilgrim Contra o Mundo (filme apenas)

Assim como a Mulher Morta/Desaparecida, a Mocinha que Ensina o Herói a Viver Intensamente (mais conhecida como Manic Pixie Dream Girl) existe unicamente em função do protagonista homem. Adorável, esquisitinha e cheia de energia, seu objetivo de vida é fazer com que o pobre protagonista profundo e deprimido aprenda a olhar para a vida de forma diferente e, com isso, consiga sair do seu status melancólico e encontrar a felicidade.  

estereótipoSuas principais armas: ser fofa e ter bom gosto musical.

 

Em suma, o arquétipo da Manic Pixie Dream Girl é definido principalmente pelo seu status secundário e por uma falta de vida e história própria. Porque né, mudar a vida do protagonista homem é trabalho em tempo em integral.

(Ver também Será a Manic Pixie Dream Girl a Versão Moderninha de Bela, Recatada e do Lar?)

As Mulheres Nuas ou com Pouca Roupa que Compõem o Cenário

Exemplos: Projeto X – Uma Festa Fora de Controle, Anjos da Lei, Entourage: Fama e Amizade, Game of Thrones (série apenas), Transformers

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É difícil conseguir pensar em um filme que não faça uso da hipersexualização feminina em algum momento. Em alguma medida, a maioria deles faz, principalmente comédias e filmes de ação. Em suma, basta que apareça uma ou mais garotas gratuitamente peladas ou seminuas (às vezes sorrindo safadamente para o protagonista) para que o estereótipo se concretize. 

Na maioria das vezes, essas mulheres são figurantes sem falas, mas acontece às vezes de as personagens femininas com falas de um filme serem tão objetificadas que elas acabam preenchendo os requisitos do estereótipo (Megan Fox, em Transformers, vem a mente).  

(Leia também Objetificação Feminina: Aprenda a reconhecê-la Através de 43 Pôsteres de Filmes; e Objetificação Masculina NÃO É a Mesma Coisa que Objetificação Feminina. Entenda).

A Mulher que Larga um Homem por Outro no Altar

Exemplos: Homem-Aranha 2, O Melhor Amigo da Noiva, Doce Lar, A Primeira Noite de um Homem, Noivas em Guerra

Então, a história da mulher que troca de homens no altar vai mais ou menos assim:

  1. Garota gosta de um garoto e vice-versa.
  2. Mas aí o cara pisa na bola, ou as circunstâncias não colaboram, e no fim vemos a moça no altar com outro cara – o cara errado.
  3. Mas tudo bem! Porque antes que o padre termine a missa, o herói aparece na igreja, faz um discurso romântico fantástico e a noiva foge com ele, para espanto geral dos convidados.

Dessa forma, a nossa heróina – uma descabeçada que não consegue tomar as próprias decisões – simplesmente troca de mãos no fim do filme. 

Atualmente, a variação clássica desse estereótipo – o abandono do noivo no altar – está muito manjada para ser usada, mas as mulheres continuam trocando de mãos o tempo todo nos filmes. Mal sabe Hollywood que é totalmente possível sermos felizes sem um homem do lado.


Não estou procurando um homem, vamos começar por aí!

E não tem problema nenhum com isso.

Leia também 6 Estereótipos Femininos que Hollywood Precisa Parar de Usar (Parte 1).

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